Imagine-se passar 24 horas preso numa solitária de seis metros quadrados, sendo inspecionado descritivamente a cada 40 minutos e ser considerado o preso mais perigoso de um outro país.
O complexo detalhe, que pode acabar com a sanidade mental de qualquer ser humano, é um dos momentos dramáticos vividos pelo brasileiro Ronald Soares, preso em Londres por associação ao tráfico de duas toneladas de cocaína.
No limite do inverossímil e no ritmo de thriller é como a história desse brasileiro, hoje com 61 anos, é contada no livro “Tudo ou Nada”, pelo antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário nacional de Segurança Pública do governo Lula e um dos autores dos livros “Elite da Tropa” 1 e 2, que deram origem aos dois filmes “Tropa de Elite”.
Aventura perigosa
O limbo entre o certo e errado, entre a liberdade e o cárcere, entre o ideal e o ilegal permeiam os bastidores dessa trama, ao relatar a história de Ronald, que atraído pelo sonho da liberdade em mar aberto e livre dos grilhões do trabalho, embarcou numa aventura perigosa: o tráfico de drogas.
A investida lhe custou a sentença de 24 anos de prisão, dos quais cumpriu 12, entre penitenciárias da Inglaterra e do Brasil. E o restante da pena em regime semi-aberto no seu país. O caso, que foi amplamente divulgado na imprensa britânica, é narrada pelo autor, com objetividade quase jornalística que revela uma história de drama e superação física e psicológica da trajetória deste anti-herói.
Ao descrever a trajetória de vida do jovem carioca Ronald (no livro apresentado como Lukas Mello), que largou uma carreira promissora como economista para viver a tão sonhada liberdade no mar e a aposentadoria próspera, a narrativa de “Tudo ou Nada” vai do ritmo de um livro de espionagem à psicologia freudiana, sem julgamentos, é claro.
Terror psicológico
Entre as desilusões amorosas e os prazeres proibidos, Ronald desvia a conduta tipicamente social e envolve-se nas relações perigosas do uso e do tráfico de drogas, chegando a integrar um grupo associado ao conhecido Cartel de Cali, na conexão Colômbia-Caribe-Inglaterra.
Em 12 anos, o protagonista experimentou o terror psicológico e asséptico da prisão inglesa e a realidade corrupta e sórdida do sistema carcerário brasileiro. Como diz o autor, o protagonista, “saiu do seu corpo” e vivenciou a prisão física e psicológica em realidades distintas. Em julho do ano passado, teve a pena extinta e Ronald deu nova forma à condição que sempre buscou: a liberdade.
Resenha literária publicada no caderno de cultura "2+" do jornal A Tarde (Salvador-BA)
Comments